'Tournée', dirigido e estrelado por Mathieu Amalric, abre competição oficial.
Filme usa dançarinas reais para contar história de produtor de TV falido.
Elogiado pela atuação sensível em "O escafandro e a borboleta", filme de Julian Schnabel indicado ao Oscar em 2008 em que atuava apenas usando um dos olhos, ou talvez mais conhecido do público como o vilão de James Bond em "Quantum of solace", o versátil ator francês Mathieu Amalric veio a Cannes nesta quinta-feira (13) apresentar mais uma de suas facetas: a de diretor.
Sua sétima incursão por trás das câmeras, "Tournée" conta a história de um produtor de TV francês decadente que tenta se reerguer promovendo a turnê de um grupo de strippers americanas na França. Representantes de um movimento conhecido nos EUA como "new burlesque" (novo burlesco), as dançarinas emprestam humor e alto astral ao filme que, logo, vai se desgastando à medida que a história avança.
Ao contrário do que pode parecer no começo, Joachim - o produtor que também é vivido por Amalric - não está tão no controle quanto quer fazer parecer. Pelo contrário, ele tem dificuldades em encontrar casas para as garotas se apresentarem, é rejeitado pelos amigos e até os próprios filhos, que vivem em Paris com a mãe, parecem ter perdido a conexão com ele.
Mais que uma última cartada para se recolocar profissionalmente, o grupo de strippers é também a única "família" do bipolar protagonista da história - que alterna momentos de doçura com as dançarinas a acessos de raiva e discussões.
Conhecidas por pseudônimos como Dirty Martini, Mimi Le Meaux e Kitten on the Keys - nomes que usam em seus espetáculos na vida real -, as strippers também não são fáceis: aprontam travessuras, flertam, provocam e testam os limites de Joachim o tempo todo. Mistura de teatro de comédia com show de rock e strip tease, seus números são sem dúvida os melhores momentos do filme.
"Tivemos um primeiro encontro para nos conhecer antes de começar a filmar, e nesse encontro senti que poderíamos criar uma ótima ficção a partir dessa situação caótica e de desobediência que elas vivem", disse Amalric. "A vida está cada vez mais dura com as pessoas, elas são forçadas a obedecer ou senão são descartadas. Me assusta como a sociedade força as pessoas as deixarem de serem humanas."
Feminismo e contracultura
Brincalhonas - e bem-vestidas - como no filme, as atrizes de "Tournée" explicaram um pouco das motivações e referências que estão por trás do "new burlesque", que mais do que um estilo de números musicais feitos com muito deboche e sensualidade tem também um discurso politizado.
Brincalhonas - e bem-vestidas - como no filme, as atrizes de "Tournée" explicaram um pouco das motivações e referências que estão por trás do "new burlesque", que mais do que um estilo de números musicais feitos com muito deboche e sensualidade tem também um discurso politizado.
"Os números de strip tease burlescos dos anos 40 e 50 sempre foram no sentido de nadar contra a corrente, de ir contra a cultura de que mulher tem de ficar na cozinha", defendeu Mimi Le Meaux, espécie de Marilyn Monroe tatuada e com uns quilinhos a mais que diz tirar sua inspiração das pin-ups nuas do período.
"Somos feministas, preocupadas com como as mulheres são tratadas hoje e como elas muitas vezes se odeiam", diz Dirty Martini, dona da voz mais afinada e engajada da trupe. "Parte da minha jornada é usar o burlesco para educar as mulheres sobre como podem ter uma satisfação sexual completa. Muitas que veem o meu número me param na rua e se dizem felizes por tê-lo repetido com seus maridos em casa. É uma coisa do punk, de dizer f...-se o sistema e fazer as coisas por seus próprios meios", resume.
Ansiosa para a exibição de "Tournée", que abre a competição oficial esta noite, a performer Kitty on the Keys também assume as influências do punk rock, mas não perde a ternura (e o sarcasmo) ao falar sobre sua expectativa para a sessão de gala: "Me sinto como a Cinderela indo ao baile".
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