Para o nosso correspondente em Hollywood, Steve Weintraub, editor do site parceiro Collider, não há lugar melhor para ir no começo do ano do que o Festival de Sundance. É lá, no meio dos filmes independentes, que ele consegue falar da forma mais descontraída e descompromissada possível com atores e cineastas. Em 2009, ele nos mandou um e-mail dizendo que tinha conseguido um lugar na agenda de Rodrigo Santoro, que estava lá nas frias montanhas de Utah para promover O Golpista do Ano (I Love Phillip Morris), filme em que ele atua ao lado de Jim Carrey. Veja como foi o papo entre os dois:
O que neste projeto te atraiu? Foi o roteiro? Como te ofereceram o papel e o que neste projeto fez com que você quisesse muito fazer?
Primeiramente, achei que a história era muito original. Eu li o roteiro e achei incrível. E, sinceramente, a oportunidade de trabalhar com Jim Carrey e Ewan McGregor me pareceu simplesmente fantástica, então...E gostei também do papel. Não é o principal do filme, mas foi uma experiência muito interessante. Acho que foi um papel desafiador, pelo fato de ser um cara HIV positivo. É algo que eu nunca interpretei antes, não estava familiarizado com a situação, e fiz uma pesquisa interessante no Rio. Tive a oportunidade de conhecer um cara que era HIV positivo e passei tempo com ele. Foi muito comovente e intenso.
Você é conhecido como um ator que pesquisa muito para seus papéis. Quanta preparação teve nesse filme? Foram semanas, ou...? Você poderia falar um pouco sobre isso?
Sim. Eu gosto disso, gosto do processo, na verdade. Gosto muito de entrar no processo de preparação para um personagem, porque é quando começo a conhecer algo que ainda não conheço. É quando estou aprendendo coisas, testando coisas, é quando estou descobrindo coisas. Para esse papel, na verdade, a primeira coisa que eu fiz foi entrar numa dieta, imediatamente. Então eu literalmente perdi... Ok, em libras? Deixa eu ver... Eu perdi 11 quilos. Quanto é um quilo em libras? 2 e alguma coisa? Bom, de qualquer maneira, alguma coisa por volta de 28 libras. Não dava para ver muito, só na cena que o personagem está morrendo e você só vê o rosto, mas eu estava muito, muito magrelo. Eu queria fazer isso não pelo visual, mas pela sensação. Realmente muda toda a sua energia quando você perde muito peso, então me ajudou muito. Também li o livro, só para ver como era a história, que você também não vê muito no filme, porque há muitas opções para fazer o filme. Mas no livro tinha muito sobre a relação de Steve e Jimmy. Foi simplesmente muito comovente e interessante entrar nesse mundo e tentar entender essa história de amor entre eles. E também como é ser um HIV positivo. Saber que você tem essa doença e como você lida com isso. Como você vive, sabe? E ele sabia, desde o princípio. Mas foi muito difícil, eu não sabia extamente como deveria interpretá-lo. Como você se sente quando descobre? E, como eu disse, isso não está no filme, porque a história não é sobre Jimmy e Steven, é mais sobre Steven e Phillip Morris, mas no livro tem muito disso.
Uma coisa legal do filme é que tem muitas viradas e caminhos diferentes. E não é simplesmente uma comédia ou drama. É tudo... é vida real.
Exatamente.
Essa foi uma das coisas que te atraiu para esse papel?
Sim, sim. Como eu disse, quando li o roteiro, simplesmente achei que era incrível porque tem tanta coisa acontecendo. Você ri e no momento seguinte está muito comovido. Na minha opinião, é uma história de amor. É realmente uma história de amor. Quando vi o filme, ontem à noite, pela primeira vez, fiquei muito comovido, na verdade. Acho que eles, Ewan e Jim, fizeram um trabalho ótimo e eu totalmente acreditei no relacionamento, que estavam mesmo apaixonados. E o fato de que eles são homossexuais é, na minha opinião, um detalhe. O filme não é sobre ser homossexual ou heterossexual, é sobre estar apaixonado por alguém. Então achei que isso era maravilhoso.
Jim é conhecido por ser um ator que quer fazer muitos e muitos takes, em certas cenas, para ter certeza de que acertou, ou para ter a certeza de que o diretor tenha opções na sala de edição para escolher. Você poderia falar um pouco sobre essa dinâmica?
Eu gosto disso. Não fizemos muito, fizemos algumas. Mas não foi demais, na verdade. Acho que Jim gosta de experimentar coisas também. Não é só uma questão de ter todos os ângulos, mas te experimentar. Então estávamos lá e tinha uma cena com a qual começamos a brincar e ele sugeriu de começarmos do meio e ir até o fim e depois voltar para o começo, ou algo assim. Ele gosta de tentar encontrar um momento especial e fresco, que é a verdade, e é por isso que ele gosta de experimentar tantas cenas. E acho que foi ótimo, eu gostei muito disso porque pudemos explorar mais e mais, especialmente nesse filme, sabe, porque eu não tinha muito tempo de tela. Então, qualquer chance que eu tivesse para trabalhar com o material e com Jim era um bônus. E eu realmente gostei muito disso.
Você poderia falar um pouco sobre Post Grad, seu próximo lançamento hollywoodiano depois de Phillip Morris?
Post Grad é uma comédia, é mais um filme para toda família. Carol Burnett está no elenco, e foi ótimo ter a oportunidade de trabalhar com ela. É uma atriz maravilhosa, uma pessoa maravilhosa. Tem o Michael Keaton... É um filme sobre uma garota que se forma na faculdade e está tentando entender o que quer fazer da vida, está tentando se encontrar. Eu interpreto um diretor de infomerciais, o que é bem interessante. Eu sou meio que uma vítima da situação toda. Sabe, os personagens engraçados são Carol Burnett e Michael Keaton e eu sou uma vítima de situações muito engraçadas. Mas foi divertido, muito divertido, foi muito leve, sabe? Os filmes que tenho feito, especialmente no Brasil, são filmes mais independentes, movidos pelos personagens. Sabe, Bicho de Sete Cabeças, meu primeiro filme, se passava num hospício e Carandiru se passava numa prisão, depois filmei Che, que era na floresta, então são sempre filmes muito pesados. E, de repente, estou fazendo esse filme e vou para o trabalho sem preocupações, porque é leve.
Você poderia falar um pouco sobre Che? Você tem um papel pequeno, mas muito importante nesse filme. E, também, poderia falar sobre como foi trabalhar com Steven Soderbergh?
Eu sempre quis fazer parte desse projeto, desde que ouvi falar sobre ele. E isso foi há cinco anos. Steven Soderbergh é um diretor por quem eu tenho muito, muito respeito e admiração, então fiquei tentando fazer parte do filme durante cinco anos e finalmente aconteceu, em 2008. Foi uma experiência incrível. Fiz muita pesquisa, fiquei um mês e meio em Cuba, pesquisando. Eu interpreto Raúl Castro, que agora é o presidente de Cuba, mas na época não era, apesar de já ser uma figura muito importante. Foi meio complicado também, porque ele ainda está vivo e é um personagem polêmico. E eu realmente tive que ir para Cuba, porque não achei muita informação na internet, nem nada. Você encontra com facilidade muito material sobre Fidel Castro, mas sobre Raúl tinha pouco, então fiz toda essa viagem.Trabalhei com Benício Del Toro, que é um ator fantástico e que te dá muito apoio. Ele é um verdadeiro comandante, um ator muito generoso, focado e concentrado. E todos os atores eram sulamericanos, de todas as nacionalidades que você puder imaginar: Venezuela, Colômbia, Chile, Argentina, México, Espanha também e um brasileiro. Enfim, toda a galera latina e estávamos todos juntos para tentar contar essa história. Foi muito rápido, porque estávamos rodando dois filmes. O processo foi simplesmente muito rápido, foi mesmo como fazer uma revolução. Tínhamos que estar ali, muito concentrados, não havia tempo a perder, fazíamos um ou dois takes, no máximo. Era uma coisa de "Vamos nos mexer, vamos em frente, vamos fazer". E isso é interessante, porque coloca o ator num estado muito alerta e você precisa estar absolutamente ligado, senão você perde a cena. E acho que quando você está fazendo uma revolução e está tentando atingir um objetivo desses, então você tem que ser desse jeito. Isso nos uniu também, estávamos sempre planejando o que íamos fazer e íamos construindo, aos poucos, aquela atmosfera que foi traduzida no filme. Tudo isso foram escolhas do Steven, de como ele filmou. Ele era sempre furtivo, você não via onde ele estava. Não era aquela coisa tradicional, com muitos ensaios primeiro. A cena está aqui, vamos fazer.
Você vê algum outro ator ou atriz brasileiro, além de você e Alice Braga, que poderia fazer a transição para Hollywood em breve? E quem sabe algum diretor?
Acho muitos diretores já estão fazendo a transição. Walter Salles já conseguiu isso, provavelmente foi o primeiro. Tem também o Fernando Meirelles, que também é um grande diretor. José Padilha, que foi premiado no Festival de Berlin por Tropa de Elite. E também existem outros diretores talentosos que estão fazendo essa transição, temos editores brasileiros trabalhando por toda a parte, diretores de fotografia... Acho que, nos últimos dois ou três anos, o mercado está mais aberto. Acho que esses diretores, Walter Salles e Fernando Meirelles, também trouxeram credibilidade para o talento brasileiro.
As pessoas no Brasil assistem ao Oscar de melhor filme estrangeiro como se fosse um campeonato esportivo. Você ficou chateado que esse ano um filme brasileiro não ganhou, ou você nem acompanha o Oscar?
Bem, eu assisto ao Oscar, sim. Eu só não acho que ele deveria ser o objetivo definitivo. Eu não trabalho para isso. Digo, seria ótimo ganhar, seria ótimo para o Brasil. Acho que traz credibilidade e interesse de investidores e isso impulsiona o mercado, mas acho que nós não trabalhamos só para isso, não valorizamos tanto isso. É legal, claro que é legal. Fernando Meirelles e Water Salles já foram indicados e foi ótimo, sabe? O país inteiro estava assistindo, então claro que é ótimo. Mas isso não deveria ser um objetivo. Nós fazemos filmes porque queremos fazer aqueles filmes, porque queremos contar aquelas histórias. E os prêmios são ótimos, é um sentimento incrível. Já tive a oportunidade de receber prêmios e estava com as pernas tremendo e o sentimento é ótimo. Mas, depois, você pensa "Ok, isso foi legal". Às vezes isso conta para a indústria, mas não sei... É difícil analisar qual o valor real disso, quando você já está trabalhando em cinema. E acho que temos coisas ótimas saindo no Brasil agora - especialmente agora. A indústria está mais e mais dinâmica, as pessoas estão motivadas para produzir, para dirigir, para atuar e essa é a melhor parte. Se um prêmio como o Oscar, ou o Urso de Ouro do José Padilha, ajudar a motivar as pessoas, isso é ótimo. Na minha opinião, esse seria o objetivo: motivar os outros.
Você poderia falar sobre seus próximos projetos, ou um específico sobre o qual você queira falar?
Neste momento estou decidindo qual será meu próximo filme. Tenho um projeto no Brasil, que se chama Heleno, que é sobre Heleno de Freitas, o jogador de futebol dos anos 40. A história é muito interessante e tudo já está pronto para começar a filmar. Tenho algumas coisas nos Estados Unidos e um projeto na Espanha, mas ainda não é nada certo. Sabe como é o cinema, você nunca sabe quando cada filme vai ganhar o sinal verde, quando o dinheiro estará disponível, os cronogramas dos atores e qual vai acontecer primeiro. Mas estou empolgado. O ano passado foi muito interessante e me deixou confiante para trabalhar no exterior.
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